Racismo nas escolas: em busca da equidade social
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 71% das pessoas negras ou pardas estão abaixo da linha de pobreza. A desigualdade social é cada vez mais evidente, e um dos grandes fatores é a diferença nos níveis de escolaridade. Em 2022, a taxa de analfabetismo deste grupo era 3,4 % maior do que a registrada entre os brancos.
Uma pesquisa realizada pelos “Todos Pela Educação”, identificou que 42% das crianças de 4 a 5 anos, no Brasil estão fora da escola, devido a dificuldades de acesso. De acordo com o site “Notícia Preta”, essa situação é ainda mais grave, nas famílias negras. Entre as dificuldades, estão a falta de vagas nas escolas para crianças nesta faixa etária. Estas famílias, que não conseguem pagar a mensalidade, transporte, material escolar em instituição privada e se obriga a deixar as crianças fora da escola, o que impacta diretamente a vida das mães de baixa renda que não tem onde deixar seus filhos para trabalhar.
Além disso, 70% dos jovens de 14 a 29 anos que largaram a escola são negros, o que perpetua esse sistema. Apenas a educação pode reverter esse quadro, mas muitas vezes o racismo está justamente dentro do ambiente escolar.
A escola é um espaço onde pessoas de etnias, classes sociais, gêneros e identidades diferentes aprendem a conviver, discutir ideias de forma respeitosa e a lidar com as diferenças, tornando-se assim, indivíduos autônomos e esclarecidos. É através da interação com indivíduos de origens diferentes, da troca de experiências e do conhecimento adquiridos na escolar que aprendemos a pensar criticamente, aceitar diferenças, a tomar decisões e nos posicionarmos de forma ética no mundo.
Contudo, é comum ouvirmos relatos de crianças, professores e funcionários que vivenciam ou testemunham atos racistas. Não é fácil desconstruir o preconceito, pois este problema está culturalmente arraigado no pensamento das pessoas. Infelizmente a ideologia racista ainda é muito presente na cultura das crianças. Apesar de toda informação veiculada, a escola ainda tem que lidar com crianças cujos pais despreparados repassam a seus filhos ideias distorcidas e repletas de estereótipos.
Juliana T. S. Lima, 50 anos, professora negra da rede pública de Osasco, relata que presenciou diversos casos de racismo dentro da sala de aula. Depois de lecionar por mais de 11 anos e trabalhar com projetos sociais, apoiando alunos da Fundação Casa a serem reinseridos na sociedade, ela viu muitas crianças e adolescentes serem desrespeitadas por causa da sua cor de pele, tipo de cabelo, traços físicos e pela condição social. Elas são frequentemente ridicularizadas pelas outras crianças e excluídas das brincadeiras e atividades.
A professora conta, que observou que alguns alunos negros, vítimas de atitudes preconceituosas, tem a tendência de se esconder ou isolar. Esse tipo de violência causa perda da autoestima, retraimento social e medo de se expor em frente aos outros alunos. Muitos passaram a utilizar máscaras mesmo após o fim da pandemia, para esconder o rosto e evitarem ser alvos de piadas maldosas e comentários cruéis sobre o formato dos lábios ou do nariz.
Ela conta que em um episódio, um aluno branco jogou lixo no chão e pediu para colega negra pegar, chamando-a de “escravinha”. Outro aluno negro ficou indignado com a atitude racista e a discussão terminou em agressão física. Após serem chamados a sala da diretoria, o diretor puniu apenas o garoto negro pela agressão e considerou irrelevante o comentário do aluno branco. Ignorando por completo a violência e humilhação sofrida pela aluna negra. Isso prova que a equipe pedagógica não está preparada para lidar com a questão do racismo na escola.
Crianças brancas se sentem superiores, mas os docentes acabam considerando que as crianças não agem por mau, ou que não é algo sério. Alguns chegam a dizer que não existe preconceito na escola, e que isso só existe na cabeça de quem é negro e se sente vitimizado. Na maioria dos casos, os alunos brancos não são punidos, apenas precisam pedir desculpas pelos xingamentos.
A omissão por parte da escola permite que os sujeitos reproduzam esse tipo de comportamento, pois aquilo que não é admitido, não pode ser combatido. Isso acontece porque as raízes do racismo permeiam toda a história do nosso país, desde a sua formação. Vários estudiosos já se debruçaram sobre o tema, mas apesar de todo o debate sobre a necessidade de valorização da etnia negra e indígena.
Os efeitos negativos da escravidão são sentidos até hoje. Historicamente, os negros são a maioria nas prisões, nas favelas e nas periferias. Além disso, apesar da maioria da população brasileira ser negra ou parda, a remuneração dos delas é inferior à dos brancos e o acesso a cargo de chefia também é menor.
Com salários menores, os indivíduos que habitam a periferia, tem menos acesso a opções de cultura e lazer. As escolas de bairros mais distantes, não possuem infraestrutura adequada para oferecer um ensino de qualidade. Todos esses fatores convergem para colocar a população negra em desvantagem. É uma corrida desleal, onde os brancos saem na frente e os negros possuem muito mais obstáculos para vencer antes de conseguir se posicionar no mercado do trabalho.
Mesmo aqueles que conseguem se formar e conseguir um bom emprego, precisam aprender a lidar com a violência velada, imersa na linguagem, na postura ou nas atitudes discriminatórias por parte dos colegas e superiores. Juliana relata que também identificou o racismo no ambiente de trabalho. Alguns colegas a subjugavam por ser uma professora negra e moradora da periferia. Chegou a presenciar atitudes preconceituosas de professores brancos, que acreditavam que os alunos pretos e pobres eram menos inteligentes. Sobre isso Juliana concluiu: “Como podemos combater o racismo, quando os próprios professores têm atitudes racistas?”
Nesse contexto muitos professores negros se sentem frustrados quando percebem que devido a sua cor, seus projetos não são aprovados e mesmo apresentando resultados melhores que seus colegas brancos, seus esforços não são reconhecidos por seus superiores. Quando presenciam atitudes racistas, muitos professores brancos não sabem como reagir ou tem medo de se comprometer. Por isso, preferem fingir que não veem os problemas. Outros tem dificuldade em identificar esse tipo de ação como algo ofensivo e negam que haja esse tipo de problema no âmbito escolar.
Por isso é tão necessário o debate sobre as relações sociais e as questões étnicas nas escolas. Alunos, pais, professores e funcionários precisam se sentir à vontade para conversar sobre esse tema e juntos procurarem formas de combater o bullying, que causa danos psicológicos irreparáveis, como ansiedade, depressão podendo até mesmo levar ao suicídio. A discriminação atinge diretamente a autoestima das crianças e adolescentes e isso se reflete no mal desempenho dos alunos, na queda das notas, podendo causar retraimento social, pois a vítima se sente desconfortável para expor suas dúvidas e participar de atividades escolares, resultando no aumento dos índices de evasão escolar.
Visando reduzir estas disparidades, a Lei 10639/03, estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, mas apenas a criação desta lei não é suficiente.
Nas escolas o debate sobre a cultura negra costuma se limitar ao folclore ou as comemorações do “Dia da Consciência Negra”. Nesta semana, os professores negros e os poucos professores brancos que lutam ativamente por uma escola mais inclusiva, desenvolvem projetos de empoderamento e valorização da cultura negra visando a formação de indivíduos mais conscientes.
Contudo, é necessário incluir o racismo como tema transversal nos currículos escolares. Inserir o ensino da história de heróis, pesquisadores e pensadores negros, para que esses alunos tenham ícones para se identificar. O material didático e o plano de ensino deve incluir também autores negros e obras literárias que falem sobre a temática da diversidade. Desta forma, além de incentivar a leitura, essas obras dão aos alunos um arcabouço cultural para eles possam compreender e discutir sobre os problemas étnico-raciais.
É preciso desenvolver programas de treinamento e conscientização do racismo para os professores e para a equipe escolar, para que eles estejam preparados para os desafios que surgem na sala de aula. Além de garantir condições justas de trabalho para os professores negros, com equiparação salarial e tratamento igualitário. Também é importante incentivar a presença dos negros na vida acadêmica e política.
Outra medida importante, é desenvolver intervenções pedagógicas nas escolas incluindo os pais. A família deve discutir e refletir sobre este tema, para que as crianças não reproduzam o comportamento preconceituoso fora da sala de aula. Professores e as famílias devem se unir para combater atitudes desrespeitosas, desenvolvendo uma escuta acolhedora com estudantes vítimas de bullying.
Vale lembrar que de acordo com o artigo 227, Constituição federal, 1998: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
A Comissão de Direitos Humanos (CDH), PL 288/2022, também orienta as escolas a incluir o combate ao racismo como parte de seu currículo disciplinar obrigatório para a educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. Este assunto precisa ser abordado em sala de aula, para que através da educação possamos enfrentar o racismo, e desenvolver o respeito a diversidade étnico-racial.
3 Comments
Vânia você e maravilhosa e surgiu em um momento que eu precisava de alguém para falar ,gritar por mim de verdade obrigado e se precisa de alguém para falar na bisO de um aluno tenho um trabalho de um aluno magnífico .
Vania eu precisava de alguém para falar ,gritar por mim de verdade obrigado e se precisa de alguém para falar na bisO de um aluno tenho um trabalho de um aluno magnífico .
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